sexta-feira, 30 de dezembro de 2022

Kalika Purana


Namaste,

 

O Kalika Purana é um dos primeiros registros claramente identificáveis do inicio de uma Teologia centrada no aspecto feminino da Divindade. Elementos trazidos à tona naquela escritura são bastante relevantes na estruturação do que veio à tornar-se o Shaktismo contemporâneo. Estes elementos parecem também ter auxiliado na evolução Teológica dos Tantras que lhes são historicamente posteriores.

 

Nos cinco primeiros capítulos uma interessante narrativa é apresentada – a criação do Desejo (Kama Deva) que foi necessária para que o Senhor Shiva cumprisse a sua função na TriMurti - a destruição para renovação de ciclos cósmicos. Essa iniciativa é planejada pelos Senhor Brahma e Vishnu que pedem à MahaMaya (Kali) que assuma a forma do desejos de Shiva (KamaRupini) de forma que Ele pudesse ser trazido à atividade.

 

Outras narrativas inspiradoras são apresentadas nesta primeira parte (Purva Khanda) do Purana. Alguns exemplos são: 1. preparativos para que Shiva, o asceta, aceitasse uma esposa. As disciplinas espirituais de Daksha para tornar-se o pai de MahaMaya. O casamento e a destruição de seu Yajña que encerra mitologicamente o ciclo dos ritos Brahmanicos. 2. A função de Varaha Avatar como personificação do sacrifício cósmico. 3. o dilúvio universal. 4. a encarnação de Chandra Shekhara e TaraVati, Avatares do Senhor Shiva e da Mãe Divina, e posterior nascimento de Vetala e Bhairava. Etc...

 

À partir do capitulo 51 deste Purana inicia-se o Uttara Khanda, a parte superior, onde os ritos e práticas espirituais são descritos. O primeiro Vidhi (injunção) apresentada é sobre a maneira bem sucedida de se propiciar o Senhor Shiva. Este conhecimento é dado à Vetala e Bhairava, seus filhos, para que eles resgatem sua verdadeira identidade e opulências.

 

Os 13 capitulos seguintes, do 52 ao 65, descrevem o Devi Kalpa – os rituais propiciatórios para diferentes formas de Shakti. As disciplinas espirituais relacionadas à Vaishnavi, MahaMaya, Kamakhya, Sharada e Tripura são descritas neste trecho.

 

A partir do capitulo 66 detalhes específicos de cada Puja são orientados com clareza. Capitulo 66 – descrição das saudações e Mudras usadas em ritos; 67 – ritos de BaliDana e seus eventuais substitutos; 68 – como preparar e oferecer o Asana em Pujas; 69 – detalhes sobre as ofertas de tecidos, incenso e lamparinas; 70 – a seleção, preparo e oferta de alimentos à Shakti; 71 – a importância da oferta de Pradakshina e saudações finais (Namakara).

 

Os cinco capitulos de 72 à 76 descrevem aspectos e detalhes especiais (Vishesha) numa Puja. O Guru saberá elucidar quando, como e por que realizá-los.

 

O trecho dos capítulos 77 à 79, sendo três capítulos no total descreve detalhes geográficos na região da montanha onde está instalado o Templo de Kamakhya.

 

Dos capítulos 80 à 90 uma miscelânea de assuntos é abordada com destaque para o Raja Dharma (código de conduta social e litúrgica dos reis e nobres) e Dharma Shastra. A importância e os detalhes da realização do festival do Senhor Indra são orientados no capitulo 87. Este Purana encerra-se com a descrição das dinastias originadas por Vetala e Bhairava após seguirem as orientações apresentadas.

 

 

sexta-feira, 21 de outubro de 2022

Oferta de carne para os ancestrais


 

Namaste, ou seja, olá.

 

Os Tantras prescrevem e orientam também sobre a adoração aos ancestrais. Em alguns textos afirma-se que Moksha, a Libertação Final, não é obtida sem que os ancestrais sejam anteriormente propiciados.

 

Este conceito não é exclusivo dos Tantras pois estas escrituras dão continuidade ao mesmo Dharma prescrito nos Vedas e nos Puranas. O Tantra não é considerado Adharmico (antagônico ao Dharma) nem tampouco Vedabahya (alheio aos Vedas).

 

Há inúmeras referencias de ritos de propiciação aos ancestrais descritas nos Tantras e Puranas assim como também descritas nos Vedas. As injunções Védicas são seguidas por aqueles cujas famílias preservaram o Dharma Védico. As injunções Tantricas para gratidão aos ancestrais devem ser seguidas apenas por aqueles que foram iniciados nesta tradição.

 

Já aqueles que desejam expressar sua gratidão dentro da perspectiva do Hinduísmo de uma forma responsável e harmoniosa podem seguir as injunções prescritas nos Puranas.

 

Há Puranas Vaishnavas como o Garuda Purana e o Vishnu Purana que detalham estes ritos de forma que possam ser seguidos por todos. No Vishnu Purana estas orientações são descritas no livro III, capítulos XIII à XVI. Vamos ao que é recomendado no capitulo XVI e pode ser feito mensalmente no Amavasya, último dia de cada mês lunar.

 

“O sábio Aurva disse:

Os ancestrais permanecem satisfeitos por um mês pela oferta de itens comestíveis (numa cerimônia de fogo), peixe ou (um dos sete tipos) de carne (de coelho, pássaros, suína, de cabra, de antílope, cordeiro ou bisão). Ou de maneira permanente pela carne de rinoceronte.”

Vishnu Purana, livro III, capitulo XVI, versos 1 e 2.

 

Observemos que o Sanatana Dharma (“Hinduísmo”) não baseia-se apenas nos dados escriturais, ele é uma religião viva ! A orientação dos Gurus e eruditos devidamente preparados pelos anos de estudo é essencial quando quaisquer duvidas ou orientações sejam necessárias.

domingo, 16 de outubro de 2022

Importância das referências escriturais


 

Mencionamos com freqüência a necessidade de referencias escriturais para a compreensão e estudo do Dharma. Mas afinal, o que são referencias escriturais e como podemos apreciá-las ?

 

Conforme definido pelo próprio termo elas são referencias, ou seja, fontes fidedignas de um determinado conhecimento. Fontes que se aprofundam em seus conceitos e reflexões e que, portanto, podemos confiar. Quaisquer Dharmas levam em consideração duas principais referencias: as escrituras (Shastras), ou seja, os textos sagrados da tradição e a autoridade de seus Gurus que orientam os procedimentos dos Templos e Ashramas.

 

As escrituras não são apenas uma lista de nomes na descrição de uma página do FaceBook, elas são textos que podem e deveriam ser pesquisados. Aquele(a) que cita uma escritura deveria também deixá-la disponível com facilidade para que outros interessados também pudessem pesquisá-la. Isso é honestidade intelectual.

 

Muitas vezes aqueles que alegam determinadas referencias escriturais nunca leram os livros mencionados e são os mesmos que os desprezam e contradizem em suas citações e “frases de efeito”. Isso é desonestidade intelectual porém é bastante comum na internet.

 

As vezes encontramos citações seguidas de “fulano(a) de tal” Devi, ou “beltrano(a)” Prem e nem sempre estes nomes foram dados pelo Guru da pessoa ou sequer são usados por alguém que realize práticas espirituais. Ocasionalmente podem ser apenas apelidos inventados pela própria pessoa para simular alguma autoridade.

 

Se você sente um genuíno carinho ou afinidade por Shri Shiva, ou o Senhor Ganesha ou quaisquer outros Devas procure conhecê-los melhor, leia diretamente as escrituras que orientam a melhor maneira de agradá-los.

 

Muitos influenciadores(as) falam pelos cotovelos coisas inventadas em suas próprias cabeças – “Shiva não precisa de Templos” (Por que, então, foram construídos ?); “Basta seguir seu coração” (Aqueles que se jogam das pontes também seguiram os seus próprios corações pois não encontraram ninguém que os orientassem); “O importante é somente o amor” (Quantos não matam e destroem o objeto amado com esta mesma alegação ?)

 

O Dharma frutífero se sustenta sobre três pilares relacionados ao três Gunas que mantém todo o mundo: o conhecimento (Jñana), a ação (Kriya) e a fé (Shraddha). Sattvas, Rajas e Tamas.  

domingo, 9 de outubro de 2022

Temor de Magia Negra

 

Tudo parecia estar bem e, de repente, a pessoa se vê envolvida por dificuldades e problemas à serem resolvidos. Muitos podem ser pequenos ou simples mas a sua quantidade num curto espaço de tempo surpreende e traz a impressão de que algo incomum estaria acontecendo.

Entre algumas pessoas interessadas em assuntos espirituais eventualmente surje uma preocupação - "Oh, fizeram magia negra contra mim !" Uma atenta reflexão pode nos ajudar à identificar se este temor possuiria algum fundamento ou não.

O primeiro ponto para reflexão é estatistico e bem objetivo - raros são os adeptos de quaisquer correntes religiosas capazes de realizar, com sucesso, alguma repreensão espiritual à terceiros. Na maioria dos casos o algoz faz apenas um desabafo baseado em improvisação verbal com considerável carga emocional ("Xilique"). Isso é muito pouco para alterar a vida de alguém ....

Em contrapartida é muito comum que as pessoas se deslumbrem e, até realizem por algum tempo, práticas espirituais sem nenhum conhecimento ou critério. Algumas destas práticas como usar "numeros mágicos" nas telas de perfil das redes sociais não possuem nenhum fundamento e, portanto, são abandonadas após um periodo de sucessivos fracassos. Porém há outras práticas que usam elementos efetivos que interagem com forças sutis: usar de "oferendas", recitar "Mantras" achados na internet ou realizar ritos  inventados recentemente porém apelidados de "tradição".

Ações impensadas como as descritas acima podem parecer inócuas ou até divertidas. Muitos se entusiasmam ao imaginar que estão fazendo algo diferente ou especial porém, com o tempo, surjem os frutos da ação (Karma Phala). A imensa maioria dos casos de "ataque mágico" ou "magia negra" são apenas isso - a colheita dos frutos de ações anteriores realizadas pela própria (suposta) vitima.

A reflexão mais valiosa vêm então às nossas mentes: "Como cada um de nós tem dirigido a sua vida espiritual ?" Enterrar a cabeça na areia e acreditar em vão que nada de mal nos acontecerá não é uma estratégia madura. Dirigir nas estradas sem atenção, sexo sem preservativos ou práticas espirituais sem criteriosa orientação são portas abertas para eventuais "acidentes".

 

quarta-feira, 21 de setembro de 2022

Como celebrar o Navaratri

 

 O Navaratri, o festival de nove noites dedicado à Deusa, pode ser celebrado de diferentes maneiras conforme a tradição familiar ou o Sampradaya ao qual o devoto pertença. Então teremos diversas possibilidades conforme o devoto 1. Não seja iniciado em nenhuma tradição; 2. seja Shivaista ou 3. seja Vaishnava. Entre os iniciados Shakta-s ou Tântricos há três procedimentos básicos que devem ser instruídos pelo Guru de cada família espiritual. Portanto o Tântrico deve procurar seu Guru para receber orientação.

 

 

Entre aqueles que não são iniciados em nenhuma tradição porém  que apreciam a Deusa e desejam prestar-Lhe reverencias o NavaRatri é celebrado da seguinte forma: 1. os três primeiros dias são dedicados à MahaKali, 2. os três dias seguintes à MahaLakshmi e 3. os três últimos dias à MahaSarasvati. Estas três formas da Deusa Shakti correspondem aos três Charitas (partes) da escritura Devi Mahatmyam. Aqui o procedimento pode ser bem simples como jejuar durante o dia e ter uma única refeição à noite. Ouvir os Charitas correspondentes também será muito auspicioso.

 

 

Entre os iniciados Shaiva, ou seja, aqueles que receberam um Mantra do Senhor Shiva em suas iniciações o festival de Navaratri é celebrado da seguinte maneira: 1. no primeiro dia celebra-se Shailaputri, 2. no segundo dia Brahmacharini, 3. no terceiro Chandraganta, 4. no quarto Kushmanda, 5. no quinto Skandamata, 6. no sexto Katyayani, 7. no sétimo dia Kalaratri, 8. no oitavo dia MahaGauri e 9. no nono Siddhidatri. Observemos que esta seqüência de Shaktis nos noves dias é igual ao BhadraKali Vidhanam praticado entre Shaktas e Tântricos porém as Pujas e Mantras correspondentes podem variar.

 

 

Entre os Vaishnavas (Shri, Ramananda, VishnuSvami, Vallabhacharya, Pushtimarga, Nimbarkacharya e Kumara Sampradayas) a celebração será feita â nove Shaktis correspondentesà cada um dos nove dias: 1. ShriDevi, 2. AmritodBhava, 3. Kamala, 4. ChadraShobhini, 5. VishnuPatni, 6. Vaishnavi, 7. Vararoha, 8. HariVallabha e 9. Shangini. Há também uma correspondência astronômica na celebração do NavaRatri entre estas tradições – no décimo dia o Shravana Nakshatra deverá estar nos céus, esse é o Nakshatra mais querido ao Senhor Vishnu e, portanto, um festival é feito em honra à Venkateshvara no grande Templo de Tirumala. Aqui a adoração de Lakshmi e Hayagriva é realizada diariamente junto à Shakti correspondente ao dia.

 

 

Entre os Sampradayas de Madhvacharya e Gaudiya o festival de NavaRatri é festejado com ênfase em nove Shaktis que recebem nomes regionais conforme a língua falada, são elas: 1. “Alicerce e Topo” no primeiro dia, 2. Inteligência, 3. Força Pessoal, 4. Fama, 5. Paciência, 6. Coragem, 7. Saúde, 8. Agilidade e 9. Eloqüência. A adoração à Hanuman é realizada diariamente junto à Shakti correspondente à cada dia.

 

Um Feliz NavaRatri à todos !

 

sábado, 17 de setembro de 2022

Virilidade Espiritual

 

É compreensível que o homem impotente em espírito, incapaz de esforçar-se ou verdadeiramente apaixonar-se por tudo o que há na Criação transfira e, então, identifique suas características na Divindade, em deus. Surgem então as crendices: “deus não precisa de incenso, nem de alimentos”; “deus é apenas um serviçal do homem, ele é fiel”.

 

Por misericórdia da Divindade Todo-Poderosa e para resgatar os homens fracos e decadentes do Kali Yuga, as escrituras Tantricas foram reveladas para este período histórico no qual vivemos. Escrituras para a salvação dos “heróis” (Vira em Sânscrito). O Vira é aquele que possui “Virya”, palavra cuja raiz deu origem à “Virilitas” em Latim, virilidade em Português.

 

Os Deuses providos de virilidade apreciam o perfume do incenso, aceitam as ofertas de flores e alimentos e ..... até dançam. Já o deus desprovido de virilidade ..... bem, esse já não é mais um “deus”, transformou-se em apenas um fantoche nas mãos dos homens. Homens tão frágeis quanto ele, homens que se saciam apenas com a “palavra”.

 

Boa parte das religiosidades deste nosso tempo estão contaminadas pelas crendices do protestantismo cultural. Pela fantasia de que apenas mencionar as palavras “almoço” ou “jantar” saciariam a fome. A fome, do corpo ou do espírito, é saciada pela Ação. E, uma vez, a fome saciada, o corpo cresce em Força (Bala) e o espírito cresce em Força Espiritual (Shakti).  

quarta-feira, 14 de setembro de 2022

Prayashchitta - Expiação Hindu


 

Prayashchitta

 

               Todos os homens e mulheres estão envolvidos em ações (Karman). Enquanto encarnados não há como evitar agir. Na Bhagavad Gita o Senhor Krishna comenta  que a própria inércia não significa de forma alguma uma “inação” mas sim uma ação passiva e estática.

 

               Se tomarmos como referência os frutos de cada ação (Karma Phala) poderemos distinguir as ações entre: 1. Aquelas que desejam alcançar um resultado e 2. Aquelas onde o autor abdica antecipadamente dos seus frutos. Ao abdicar antecipadamente dos frutos da ação o homem desapega-se da ânsia de resultados – sejam eles positivos ou adversos.

 

               Quanto às ações realizadas pelos homens para atingir objetivos podemos afirmar que elas geram méritos (Punya) ou deméritos espirituais (Papa) em diversas camadas e proporções. Esses méritos e deméritos, em ultima instância, são os responsáveis pela qualidade de vida e desfrute (Bhoja) que a alma (Jiva) alcança à cada encarnação.

 

               Como todos nós estamos enredados pelas ações nos vemos não apenas na expectativa de acumular méritos mas também nas estratégias para evitar ou, ao menos, contornar o demérito eventualmente resultante. Os Sadhakas e todos aqueles envolvidos com disciplinas espirituais tem uma perspectiva à mais à apreciar – não apenas acumular Shakti, Força Espiritual, mas também prevenir-se contra o seu eventual desperdício muitas vezes inconsciente.

 

               O Dharma reconhece a importância de um procedimento em ambos os casos – o Prayashchitta, a expiação. Muitos, devido à uma formação cristã, poderão estranhar a importância desta prática no Dharma. Entretanto se olharmos de perto perceberemos que a presença dela, desde os primeiros cristãos, tem sua origem nos Dharmas pré-cristãos praticados na Grécia, Roma, Egito e nações do oriente médio.

 

               Tertuliano, ao final do século II, menciona as expiações praticadas pelos Mitraistas (iniciados no culto do Deus Mitra): - “ ... eles honram aos próprios Deuses através destas abluções (* Abhisheka em Sânscrito). Eles em todos os lugares realizam estas expiações ao carregar águas consagradas e, com elas, banhar altares, casas, templos e até cidades inteiras.”

 

               O Senhor Deus Mitra teve a origem de seu culto nos próprios Vedas onde Ele é mencionado como uma das doze formas do Sol, ou seja, um dos Adityas. Esse culto foi levado até a antiga Pérsia (País de Magha mencionado nos Saura Puranas como foco da adoração à Surya Deva). Ali Mitra era representado envolto pelos doze signos do zodíaco e seus locais de culto eram adornados com leões, signo de domicilio do Sol. Da antiga Pérsia o Mitraismo chegou à Roma e obteve grande popularidade entre as legiões pelas quais foi levado à todo o mundo conhecido.

 

               Há muitas palavras de uso litúrgico no Dharma que apresentam o mesmo significado em Grego mesmo em periodo histórico anterior à Teurgia NeoPlatonica. Termos como Abhisheka, Tarpana, Marjana e Ahuti encontram paralelos em Váptisma (“batismo”), Ierotelestiki plysis (“ablução sagrada”), Afiérosis (“santificação”) e Kameni Prosfora (“oferenda lançada no fogo”).

 

               Tendo em vista que a ação realizada inevitavelmente vai em direção aos seus frutos o Prayshchitta não anula ou invalida as ações. A função deste procedimento é gerar uma energia (ou um estado de consciência) de mesma potencia (ou intensidade) porém em direção contrária àquela que daria origem aos resultados do demérito. Vemos então que o Prayashchitta não é realizado sob uma perspectiva de hierarquização moral porém sob um ponto de vista energético, ou seja, de Shakti.

 

               Há inúmeros procedimentos descritos nos Tantras como Prayashchitta. Estes devem ser aplicados após a apreciação da ação que pode eventualmente gerar deméritos e das circunstancias envolvidas. As injunções (Vidhi-s) prescritas variam de Mantras específicos, banhos (Snanam), oferendas ao fogo (Ahuti-s), jejuns ou recitação de hinos (Stotram-s) específicos. Diante da eventual necessidade de uma purificação ou expiação verifique com seu Guru o que é feito em sua tradição.

 

Na foto: judeus ortodoxos realizam o ritual de Kaparot onde um frango é sacrificado ao deus Jeová como expiação.

quarta-feira, 24 de agosto de 2022

Varaha Pralaya - o Diluvio Hindu

 

 

Varāha Pralaya (o “Dilúvio”)

 

               Apresentaremos um brevíssimo resumo da narrativa do Varāha Pralaya conhecido entre as religiosidades Abrahâmicas como “dilúvio”. Nosso resumo, embora breve, é relevante tendo em vista que aquilo que foi registrado pelos letrados Sumérios e Babilônios foi posteriormente bastante reduzido nos textos da Torah judaica que formam a base do que é, hoje, conhecido como “bíblia”.

 

               O Varāha Pralaya é descrito em vários Purāṇas e tomaremos como referencia o Kālikā Purāṇa que é aquele mais intimamente relacionado à tradição Tântrica. Observemos a importância do Kālikā Purāṇa através da preservação e constante utilização de Mantras que foram revelados naquela escritura e que são recitados por várias escolas Tântricas.

 

               Os capítulos do Kālikā Purāṇa que se referem ao Varāha Pralaya vão do 30 ao 34 sendo que os capítulos 30 e 31 nos remetem as origens históricas e metafísicas que tornaram o dilúvio necessário. A narrativa propriamente dita inicia-se no capitulo 32. O Rshi (“profeta”) que descreve a narrativa é Markandeya, o mesmo registrou para a humanidade o Markandeya Purāṇa e o Chaṇḍi Patha, a importante escritura recitada em grandes cerimônias de fogo realizadas por Tântricos e Shaktas ao redor do mundo. Vamos ao nosso resumo.

 

               O sábio Kapila Muni surgiu durante o governo e regência de Svāyambhuva Manu e o procurou para ter um de seus desejos atendidos: obter um local para realizar suas disciplinas espirituais. Svāyambhuva Manu lhe replicou que nenhum dos sábios anteriores lhe havia pedido um local e que, no mundo, haviam muitos Templos sagrados para ele praticar suas disciplinas.

 

               A réplica de Svāyambhuva Manu deixou Kapila Muni muito irado e ele disse que, em breve, Svāyambhuva veria todo o mundo totalmente destruído, aniquilado, e submerso nas águas e que isso acabaria com seu orgulho e arrogância. Após estas palavras Kapila Muni desapareceu e não foi mais visto.

 

               Aterrorizado, Svāyambhuva Manu silenciou-se e decidiu realizar intensa Tapasya (austeridades espirituais). Ele se dirigiu à sagrada arvore Badari (“Joazeiro”, Ziziphus Jujube) na nascente de um rio. Ali a arvore fornecia sombra permanente, estava sempre verde e plena em frutos, não apresentava nem espinhos e nem folhas secas. Aquela arvore estava sempre úmida pois recebia gotas que espirravam do rio e era adorava por inúmeros sábios.

 

               Ali Svāyambhuva Manu recitou o Mantra “Saudações à VasuDeva, Aquele que tem a forma do conhecimento puro”. Então o Senhor Deus Viṣhṇu apareceu à Svāyambhuva Manu na forma de um pequeno peixe esverdeado como a sagrada grama Durva (grama Bermuda, Cynodon Dactylon). O peixe se dizia assustado e pediu que Svāyambhuva Manu o protegesse. Isso foi feito. Primeiro o peixe foi levado à uma aquário e depois à um grande lago e Svāyambhuva Manu cuidava dele como se fosse seu próprio filho.

 

               O peixinho tornou-se enorme, gigantesco, e precisou ser retirado do lago. Svāyambhuva Manu temeu não conseguir retirar o enorme peixe e levá-lo para o oceano porém ao pegá-lo surpreendeu-se ao perceber sua leveza. Ao refletir sobre a leveza daquele animal Svāyambhuva Manu lhe disse: “Oh bondoso Mahattara (Grande Alma), me diga a verdade, se isto não for um segredo. Tu és Brahma, Viṣhṇu ou Shambhu em forma de peixe. Quem és tu ?”

 

               Então o Senhor Deus Viṣhṇu falou através do peixe, foi propiciado por hinos e proclamou numa voz profunda como os trovões: “Tu tens me adorado e lhe darei o que pedires”. Svāyambhuva Manu então relatou as palavras de Kapila Muni e implorou que o mundo não fosse submerso pelas águas.

 

               O Senhor Deus Viṣhṇu disse que as palavras de Kapila Muni eram verdadeiras e que nada poderia ser feito e orientou as medidas para que Svāyambhuva Manu construisse um imenso barco para acomodar todos os seres vivos e repovoar a Terra. Ele garantiu que Jagaddhatri, a Mãe do Mundo, usaria sua Maya, seu poder espiritual, para que as cordas de amarração do barco fossem indestrutíveis. Todas as sementes do mundo, os livros sagrados dos Vedas e sete Munis (sábios) deveriam ser levados ao barco. Afirmou que atenderia à todos que recitassem o Mantra previamente usado para evocá-lo e disse também que após consultar o sábio Dakṣha Ele (o Senhor Deus) deveria ser novamente evocado e que se apresentaria prontamente.

 

               Svāyambhuva Manu fez com que as orientações do Senhor Deus Viṣhṇu fossem cumpridas. Arvores foram cortadas para se obter a madeira necessária, a corda e tudo foi preparado de acordo. O dilúvio veio e o barco esteve à salvo até a descida das águas. Com o recuo das águas o barco ancorou-se ao Oeste dos Himalayas. Então os Senhores Deuses Brahma, Viṣhṇu e Śhiva apareceram diante do barco e falaram à Nara e Narayana, à Dakṣha, à Svāyambhuva Manu e aos sete sábios. À Nara e Narayana foi orientado que restabelecessem os Deuses e seus cultos em seus lugares e que novos locais fossem criados. Svāyambhuva Manu foi orientado à replantar as ervas, plantas e arvores cujas sementes estavam estocadas. Dakṣha e os sete Grandes Sábios foram orientados à estabelecer os três altares de fogo (Garhapatya, Ahavanya e Dakshina), realizar os Yajñas (sacrifícios) e propiciar o Senhor Deus Viṣhṇu de forma que a Criação pudesse prosperar e expandir-se. Segue-se então a narrativas das centenas de descendentes daqueles que estavam no barco.

 

Que a Divina e Eterna Mãe Kali nos proteja sempre.

 

Índice dos capítulos consultados e seus sumários:

Kālikā Purāṇa, capitulo 30 – Conflito entre Varāha (forma do Senhor Deus Viṣhṇu) e Sharabha (forma do Senhor Deus Śhiva). A parte final deste capitulo informa sobre os Varāha Ganas (“tribos” de Varāha) e os Sharabha Ganas (“tribos” de Sharabha) e a destruição completa dos primeiros devido à superioridade bélica dos Sharabha Ganas.

 

Os Varāha Ganas se alimentavam de frutas, flores, raízes e água e são descritos como não sendo cruéis em suas ações. Os Sharabha Ganas, também conhecidos como Pramathas, são descritos como aqueles que alimentavam-se de carne no ChaturDashi (décimo quarto dia lunar).

 

Kālikā Purāṇa, capitulo 31 – Com o desencarne de Varāha todos os rituais, os sacrifícios (Yajñas), surgem. Cada parte do corpo de Varāha deu origem á determinados tipos de rituais.  

 

Kālikā Purāṇa, capitulo 32 – Svāyambhuva Manu é advertido pelo sábio Kapila sobre um futuro dilúvio que destruiria todo o planeta Terra.

 

Kālikā Purāṇa, capitulo 33 – Svāyambhuva Manu entra em severas austeridades em busca da Divindade para saber como agir. O Senhor Deus Viṣhṇu apresenta-se à ele em sua forma de Matsya Avatara e o instrui como se salvar e salvar todo o conhecimento existente até então.

 

Kālikā Purāṇa, capitulo 34 – O barco construído é salvo em terra e os Senhores Deuses Brahma, Viṣhṇu e Hara (Śhiva) aproximam-se para instruir Svāyambhuva Manu, Dakṣha, Nara e Narayana e os sete Munis (sábios) sobre a reconstrução do mundo. As descendências daqueles que estavam no barco são descritas.

domingo, 5 de junho de 2022

Kaula Tantra, Trika e Krama

 

Namaste,

 

               Há interesse em certos aspectos acadêmicos da relação entre o Kaula Dharma e as antigas escolas Trika (“Tríplice”) e Krama (“Método Sucessivo”) costumeiramente associadas ao “Shivaismo da Caxemira”. Bem, tentaremos abordar este tema com brevidade porém de modo suficiente apenas para posicionar os Kaulika Sadhakas (adeptos do Kaula Dharma) numa visão geral destas tradições.

 

               O Sadhaka é aquele que estuda o Dharma não para escrever uma tese mas sim para obter Moksha, a Libertação Final, ou seja, há nele(a) uma perspectiva prática na apreciação dos Tantras e suas escolas. Essa é a perspectiva que valorizaremos em nosso comentário. Sob este ponto de vista, do iniciado, os Tantras não são meros escritos mas sim textos revelados pelo próprio Senhor Deus Shiva. Isso nos convida à uma apreciação do caráter sagrado e atemporal das escrituras e, portanto, exige algum preparo para lidar com seus aspectos mais herméticos.

 

               Essa apreciação, em plenitude, naturalmente será mais provável entre aqueles que praticam os Vidhi-s (injunções, ou seja, o que é prescrito) nestes textos. Essa continuidade histórica entre os praticantes de determinadas disciplinas espirituais é chamada de Parampara (Linhagem Espiritual) e é nela que devemos buscar uma sensata compreensão de vários aspectos do cotidiano do adepto.

 

               Bem, tendo em vista a importância do Parampara que detalha e orienta sobre estas tradições vamos iniciar nosso pequeno estudo pelo comentário do sábio Tantriko AbhinavaGupta à respeito da relação entre as escolas Trika e Krama. Para ele o sistema Krama era o aspecto mais esotérico dos ensinamentos da escola Trika. Mas, o que exatamente ensinavam estas escolas ?

 

               A escola Trika é assim chamada devido à sua perspectiva do aspecto tríplice da Deusa como 1. Parapara (Aquela que é Suprema), 2. Para (Aquela que está “além”) e 3. Apara (Aquela que não está “além”). Já a escola Krama é conhecida pelo seu método de iniciação através das “12 Kalis” onde a Mãe Divina, ali uma personificação do Sol, atravessa doze diferentes estágios/signos para completar seu ciclo. Por isso essa escola também é conhecida como Bhanavi Krama (Método das Sucessões Solares). De maneira análoga esta jornada também é apreciada pela alma encarnada como uma narrativa de sua busca pela Libertação Final.

 

               Os sábios Tantrikos, mesmo antes de AbhinavaGupta, já elucidavam a metodologia Krama como o eterno e constante fluxo da Consciência através de doze diferentes estágios. As luminosas formas descritas ali eram chamadas de MarichiDevata ou RashmiDevata, ou seja, Devas ardentes ou brilhantes (tal qual o Sol). O Chakra ou Mandala (circulo ou conjunto) destas formas é o Prakasha Chakra – o Circulo que brilha.

 

               Qual seria a aplicação deste sistema para a obtenção de Moksha ? Conforme já anteriormente afirmado nos Vedas a Libertação Final não pode ser obtida por nenhuma ação. Desta forma também a escola Krama não preconizava ações especificas mas sim a prazerosa percepção (Amrta Krama) de que a consciência individual reflete (Vimarsha) o brilho (Prakasha) da consciência Divina. Esta percepção, esta vivência, essa tomada de consciência é descrita no tratado “Ishvara PratyabhiJña Karika” (Os Axiomas de Reconhecimento do Senhor Deus) escrito pelo genial sábio Tantriko UtPalaDeva.

 

               Ora, Shiva Krpa, a misericórdia do Senhor Shiva, é eterna e sempre atuante. Ela nunca estará ausente na Criação, no Universo. Devido à esta misericórdia os Tantras foram revelados no Kali Yuga (Era da Discórdia) quando as disciplinas prescritas nos Vedas tornam-se difíceis de ser realizadas. Diante desta Verdade (Sat) que é parte dos três atributos da Divindade (Sat, Chit e Ananda) podemos afirmar que o Trika e o Krama não estão absolutamente extintos mas foram preservados pelo Senhor em outras de suas revelações.

 

               Chegamos, então, ao ponto de apreciarmos o Kaula Tantra como continuador das Verdades reveladas nos Vedas assim como dos métodos praticados em outras escolas Tantrikas. Diz o Kularnava Tantra:

 

यथा हस्तिपदे लीनम् सर्वप्राणीपदं भवेत्

दर्शनानि सर्वाणि कुल एव तथा प्रिये॥ १३॥

yathā hastipade līnam sarvaprāṇīpadaṁ bhavet  |

darśhanāni cha sarvāṇi kula eva tathā priye || 13 ||

 

“Oh Minha Querida, da mesma forma que as pegadas de todos os seres vivos desaparecem dentro da pegada de um elefante, os seis Darshanas (Samkhya e Yoga; Nyaya e Vaisheshika; Purva Mimamsa e Uttara Mimamsa (Vedanta)) e todos os demais desaparecem com certeza no Kaula Dharma.”

Kularnava Tantra, capitulo II, verso 13

 

               Portanto observemos que o prazeroso reconhecimento da unidade entre as Consciências Divina e Humana estão presentes como Siddhi obtido em Kaula Sadhanas. Não são doze também os Mantras de Kali diretamente revelados no MahaNirvana Tantra ? A Deusa também não é descrita como Tríplice nos Rahasyams (Segredos) da escritura Chandi Patha recitada regularmente pelos iniciados ?

 

               Da mesma maneira que Agni (Deus Fogo) não entrega Dravya (oferendas) aos demais Deuses se estas forem oferecidas nas cinzas apagadas, o adepto não torna-se Siddha (Bem sucedido) se buscar realização sem linearidade de transmissão. É a misericórdia de Shiva, o Primeiro Guru, que permite que ainda haja Gurus vivos no Kali Yuga. Guru morto não transmite Mantras.

 

Que Mãe Kali nos proteja sempre.

domingo, 8 de maio de 2022

Sampradayas Contemporaneos

 

Namaste,

 

O Sanatana Dharma (“Hinduísmo”) é bastante diversificado e há inúmeras tradições historicamente estabelecidas à milênios. Comentemos sobre as principais tradições (Sampradayas) estabelecidas atualmente. Estas surgem, como movimentos independentes, no periodo Puraniko do sub continente Indiano. Este período histórico se desenvolve na medida em que o Brahmanismo (antiga forma do Sanatana Dharma) perde popularidade. Vejamos:

 

Smarta

Religiosidade não-sectária que adora os Cinco Grandes Devas). É baseado em elementos dos Mimamsas (Purva e Uttara) e do Yoga. Algumas de suas práticas mesclam elementos Védicos e Tântricos. Esta tradição apresenta um caráter bastante ortodoxo e influencia várias escrituras de outras tradições como o “Mantra Yoga Samhita” e o texto Tântrico (Shri Vidya) “Mantra MahoDadhi”.

 

O Shaktismo

Apresenta religiosidades centradas no aspecto feminino da Divindade que é personificado como Shakti. O culto à Mãe Divina é muito presente na Índia entretanto é indevidamente colocado num segundo plano onde as Shaktis femininas, embora constituam o foco das práticas, são reconhecidas apenas através de seus consortes masculinos. Esta tradição apresenta linhagens Pauranikas, mais comuns, e Tantrikas como o Shri Vidya e o Kaula Dharma. 

 

O Shivaismo

Religiosidades centradas no Senhor Shiva presentes desde o período Védico sob a forma de Rudra. Seus principais expoentes são: o ViraShaiva, o Shaiva Siddhanta, os Lingayatas e a linhagem Natha. Também os Kapalikas e Aghoris, ambos de forte influencia Tântrica, fazem parte deste grupo. Muitas práticas Shaiva tem origem em tradições hoje extintas como os KalaMukhas e os Pashupatas porém elas persistem em linhagens contemporâneas.

 

O Vaishnavismo

Religiosidades centradas em Vishnu ou em um de seus Avatares. As quatro principais tradições deste grupo são todas originadas no período Puraniko, são elas: 1. Vishisthadvaita baseada nos ensinamentos do sábio Ramanuja; 2. Dvaitadvaita do sábio Nimbarkacharya; 3. Dvaita do sábio Madhva; e 4. PushtiMarga do sábio Vallabhacharya. O Gaudya Vaishnavismo, popular no Ocidente, vem da doutrina TattvaVada promulgada por Madhva (3).

 

O Ganapatya

Religiosidade centrada em Ganesha e que tem como principais referencias escriturais o Ganesha Purana e o Mudgala Purana. Esta linhagem e a tradição Saurya foram as que mais sofreram com as invasões muçulmanas pois estavam nas principais rotas de ataque. Enquanto as linhagens Saurya foram extintas o culto ao Senhor Ganesha prosperou e se muito relevante em todas as demais tradições, Ganapati é honrado antes de quaisquer empreendimentos. Entretanto detalhes exclusivos de sua liturgia, mencionados nos seus Puranas, estão hoje quase esquecidos.

 

Os Saurya-s

Religiosidades centradas na adoração ao Sol. Estima-se que o centro geográfico desta tradição estava na região de Magha, entre o atual Gujarat e a Pérsia antiga. Observemos que Magha também é o nome do mês Védico onde o Sol está em seu domicilio – signo de Leão. Talvez muitas religiosidades do antigo Crescente Fértil até Roma possam ser consideradas aspectos desta tradição tendo em vista que o Sol era a mais relevante forma da Divindade entre elas. O Samba e o Bhavishya Puranas são suas principais escrituras e o seu festival Cchath foi preservado em vários locais.

 

Kaumara

Religiosidade centrada em Murugan/Kartikeya cujo principais centros de culto encontram-se no sul da Índia. Ali Kartikeya é reconhecido como a principal forma da Divindade e todos os demais Devas formam sua corte celestial. Muitas de suas práticas são oriundas do Shivaismo que lhe precede historicamente porém há também relevantes elementos que lhe são exclusivos, vide o festival de Thaipusam que celebra a lança usada pelo Deus e que foi recebida como presente da Mãe Divina.

quarta-feira, 4 de maio de 2022

Temor de Magia Negra


Namaste,

 

È relevante comentar sobre o (indevido) temor que alguns Sadhakas podem apresentar diante de algo que denominam “Magia Negra”. Bem, este termo se refere à possibilidade de uma pessoa intervir no bem-estar, saúde ou “sorte” de uma outra pessoa através de meios sutis, energéticos ou “mágicos”.

 

Essa definição afasta, logo em primeira instancia, uma outra situação que é a possibilidade de um elemento mal-intencionado fazer uso de rumores para prejudicar a reputação, o trabalho ou os negócios de seu desafeto. A simples maledicência é, de longe, a estratégia mais comum usada para prejudicar alguém. Pouquíssimos desafetos possuem o conhecimento, a aptidão ou a determinação para usar métodos mais sutis.

 

Ao ser descartada uma eventual fofoca maliciosa ou um possível diagnóstico de hoisofobia (medo de sofrer encantamentos) por trás de má sorte, estagnação ou insatisfação geral do Sadhaka com as condições de sua vida, devemos analisar o que poderia causar este momento de tribulação.

 

Observem a prudência em se afirmar a possibilidade de “Magia Negra” logo à principio pois um Sadhaka que recebe um Mantra de maneira tradicional e o pratica com regularidade estaria além de uma eventual vulnerabilidade à tais atos maliciosos. Portanto, devemos buscar as causas de infortúnio na esfera pessoal do próprio Sadhaka.

 

Existem algumas possibilidades que podem intervir no fluxo benéfico de nossas próprias energias e, da mesma forma que um banho físico nos previne dos dissabores da ausência de asseio corporal, uma rotina de “limpeza energética” nos manterá sempre tranqüilos em nossas disciplinas espirituais.

 

Enumeramos abaixo alguns fatores que podem afetar negativamente:

 

Shakti Sthambana – A estagnação da energias elementais à nossa volta.

Sabemos que Shakti atua no plano físico através dos cinco grandes elementos (Pañcha MahaBhutas). A adoração puramente mental sem o alicerce dos cinco sentidos (Jñanendriyas - que são o vinculo entre os grandes elementos e a mente (Manas) não é prescrita para aqueles que mantém rotinas de trabalho, estudos e/ou cuidar da casa e família, ou seja, para os Grhastas. Portanto a rotina de Sadhana deve, periodicamente, incluir frutas, flores e outras ofertas (Dravyas) que interajam com os sentidos.

 

Mantra Dosha – “Impurezas” internas, comportamentais, que contaminam o Mantra após o seu recebimento na cerimônia de Diksha.

O Tantra entende os Mantras como seres “vivos” que interagem com os indivíduos e as condições sob as quais são praticados da mesma forma que os próbióticos benéficos interagem com o metabolismo de seu hospedeiro. O Kularnava Tantra e o Sharada Tilaka Tantra apresentam dezenas de Doshas que podem afetar um Mantra, mesmo que este tenha sido recebido através de uma Diksha legitima.

 

Ari Mantra Kriya – Um Mantra que não foi recebido de boca à ouvido, que não se sabe seu Viniyoga ou seu real Dhyanam (visualização prescrita) ou feito sem regularidade ou outras “deficiências” (Chidram) pode acumular inúmeros Doshas. Após algum tempo este Mantra pode tornar-se “Ari”, ou seja, inauspicioso. Algo como um inimigo interno que criará obstáculos às realizações da pessoa que se dedicou ao seu uso.

 

Em ordem decrescente de probabilidade apresentamos possíveis causas de infortúnio entre Sadhakas iniciados. Este pequeno texto introdutório visa apenas trazer a reflexão que muitos de nossos problemas ou insatisfações não tem origem externa mas sim dentro de nós e que muitas vezes não vemos as soluções que estão à nossa frente e nos entretemos em buscar longe, à um custo considerável, aquilo que já estava ali o tempo todo, à nossa disposição.

 

Que a Mãe Divina tenha misericórdia de todos.

domingo, 24 de abril de 2022

Visitas ao Ashrama


 

Namaste à todos,

 

Continuamos com as obras de construção de nosso Ashrama porém, com alegria, informamos à devotos, Sadhakas e amigos que o MahaKali Ashrama estará aberto para visitas em horários regulares à partir deste mês de Maio de 2022. Anote !

 

Todas as quartas-feiras das 19hs às 20:30hs teremos Satsanga com bate papo sobre o Dharma Tantrico e prática de Mantras.

Todo primeiro domingo do mês (inclusive no dia primeiro de Maio !)   teremos Puja e Homa (cerimonia de fogo) das 17hs às 19hs.

 

O MahaKali Ashrama é um grande jardim onde a Mãe Divina é celebrada diariamente. Um Templo Tântrico não é um ponto turístico mas sim a casa da Divindade e a visita à este solo sagrado é indicada para aqueles que desejam desfrutar de momentos de paz, tranquidade e aprendizado; assistir as cerimonias que são realizadas e fazer suas práticas espirituais pessoais como recitar Mantras. Tudo isso diante do Darshana (Presença Espiritual) de Kali.

 

Ao visitar um Templo Tantrico algumas condutas são adotadas para cultivar e beneficiar-se da energia espiritual do local:

 

* O que vestir ?

1a. Use roupas leves, lembre-se que recomendamos que todos se sentem no chão entretanto serão providenciadas cadeiras caso necessário.

1b. De preferência mantenha seus calçados na entrada. Devido as obras haverá tolerância ao uso de chinelos porém nos locais de cerimônias eles devem ser retirados.

1c. Aos Sadhakas e aqueles ocupados em funções litúrgicas sugerimos o uso de roupas apropriadas, sem costura, ou seja, Saris (para as moças e senhoras) e Dhotis (para os homens).

1d. Durante os ofícios à Divindade recomenda-se que os homens permaneçam sem camisa. Estas podem ser mantidas sobre o ombro esquerdo. Para as moças e senhoras desaconselhamos o uso de véus ou outros adereços sobre a cabeça.

 

* O que levar ?

1a. É muito gentil lembrar-se que a visita à um Templo é a visita à casa da Divindade e que ali não se pratica adoração insípida (sem ofertas).

1b. Flores, frutas, ghee, cereais e farinhas (de arroz, trigo) e outros itens podem ser trazidos e serão oferecidos no altar durante as Pujas.

1c. Não traga comida preparada em casa à não ser que já esteja previamente orientado(a) à fazê-lo.

 

* Como proceder na entrada ?

1a. Sugerimos, após sua chegada, a saudação e Pradakshina (três voltas) em torno de Bhumishvara - o ShivaLinga do solo sagrado instalado ao lado do Agni Shala que é o gazebo onde são realizadas as cerimônias de fogo.

1b. A saudação à MahaSimha, o Grande Leão que protege o Dharma, pode ser feita diante de sua representação onde haverá um Mandala instalado. Incenso e lamparinas de ghee podem ser acesos naquele pedestal. Estes estarão disponíveis para aquisição no local.

1c. Ao circular mantenha baixo o tom de voz e não interrompa Sadhakas e outros visitantes durante a realização de suas disciplinas espirituais.

1d. Caso deseje mencionar os Devas com maior decoro e respeito use os termos “Senhor” ou “Senhora”, não é adequado o uso de títulos mundanos de nobreza como “lorde”, “barão” etc.

 

* O que fazer ?

1a. Participe das conversas e esclarecimentos sobre o Dharma. Eventualmente orientações litúrgicas são apresentadas à interessados qualificados.

1b. Escolha um local de sua preferencia e recite seus Mantras ou solicite à um dos Pujaris (sacerdotes) que uma Puja seja feita em seu nome.

1c. Pujas à Mãe Kali ou à um dos Cinco Grandes Devas (Durga, Ganesha, Surya Deva, Vishnu e Shiva) podem ser solicitadas no momento. Demais formas da Divindade podem ser cultuadas mediante solicitação prévia.

1d. Não é permitido o registro de áudio ou visual (filmagens ou fotos) durante os ritos. Estes podem ser feitos antes do inicio ou após o término das cerimônias.

 

* Pode consumir alguma coisa ?

1a. O consumo de alimentos, bebidas ou cigarros não é permitido durante as cerimonias. Exceção é feita à Prasada que é o alimento que foi oferecido no altar e é partilhado por todos.

 

* Há local para pernoite ?

1a. O alojamento do Ashrama é dedicado aos Sadhakas e corpo sacerdotal (Pujaris) entretanto há esta possibilidade mediante solicitação prévia e disponibilidade.

 

Jaya Ma ! Todos são benvindos.

 

Na foto: Primeiro Ministro Britânico Boris Johnson visita um Templo Hindu.