segunda-feira, 30 de abril de 2012

Comentando a forma de MahaKali.





Muitos ficam intrigados pela figura de MahaKali, a Deusa Kali em Seu aspecto cósmico e universal. Quais seriam os atributos desta forma e qual o Seu significado ??

A descrição (Dhyanam) de MahaKali é mais conhecida através da escritura Chandi Path onde ela aparece antes da recitação do primeiro capítulo. Vale lembrar que o Chandi Path possui 13 capítulos sendo o primeiro dedicado à MahaKali (1 capítulo), o segundo, terceiro e quarto à MahaLakshmi (3 capítulos), e o quinto até o décimo-terceiro dedicados à MahaSaraswati (9 capítulos).

Entretanto a origem e as atribuições de MahaKali podem ser esclarecidas através de dois textos rituais auxiliares (Anga): o Pradhanikam Rahasyam (“O Segredo relativo à Matéria Primordial”) e o Vaikrtikam Rahasyam(“O Segredo relativo à Transformação”). No primeiro se afirma que MahaKali surge à partir de MahaLakshmi (A maior fortuna), ao comentar sobre MahaLakshmi, Swami Satyananda Saraswati afirma que nossa maior fortuna são os nossos ideais e, para onde eles apontarem é para lá que teremos nosso destino.

Estes “ideais elevados” (MahaLakshmi) são descritos como “brilhantes como o ouro derretido e que preenchiam todo o Vazio (anterior à criação) com sua Luz radiante” (Pradhanikam Rahasyam verso 6). Estes ideais elevados são personificados no Oriente como a Deusa de Mil Braços e Suas representações são encontradas na China, Coréia, Japão (Deusa Kannon) e Tailândia. Na Índia Ela é conhecida como MahaLakshmi e: “Apesar de possuir mil braços, Ela deve ser adorada na Sua forma de dezoito braços”. (Vaikrtikam Rahasyam verso 10). Podemos entender que esta fabulosa Deusa de Mil braços é na verdade uma representação do Dharma, os idéias mais nobres e elevados da humanidade, aqueles que mantém sua existência e garantem sua prosperidade.

À partir destes ideais elevados surge a Força que os mantém. “A Suprema Soberana ao observar o Universo vazio manifestou uma forma através unicamente de Sua energia de Tamas (Trevas)”. (verso 7) “Esta manifestação tomou a forma de uma mulher com o brilho das Trevas, um belo rosto, grandes olhos e cintura fina.” (verso 8) “Ela trazia um facão sacrificial, uma taça, uma cabeça decepada e um escudo. Trazia também um guirlanda de partes decepadas do corpo e sobre Seu pescoço um colar de crânios.” (verso 9, Todos do Pradhanikam Rahasyam).

Esta Deusa Negra (MahaKali) recebe Seus nomes e atribuições nos versos 12 e 13 do Pradhanikam Rahasyam porém Sua forma Universal só nos é revelada nos versos de 2 à 6 do Vaikrtikam Rahasyam: “Ela possui dez faces, dez pés e dez mãos.” “Ela traz um facão sacrificial, flechas, maça, lança, um disco solar, uma concha, arco, tridente, relâmpagos e uma cabeça gotejante de sangue”. “Apesar de Sua forma terrível Ela é o alicerce da beleza e da felicidade”. “Ela é a forma da Preservadora (Vaishnavi maya) e, quando satisfeita, garante à Seus adoradores o controle sobre todas as coisas móveis ou imóveis.” Poderíamos interpretar esta Deusa como o “Sol Negro” – o Sol espiritual e guerreiro que vêm armado para a proteção do Dharma e que era reverenciado por grupos Indo-Arianos na antiguidade.

Muita coisa pode ser aprendida indo direto às fontes deste conhecimento – os textos Tantrikos. Que sejam preservados. Jaya Maa!

Linga Ashtakam - Hino de oito versos ao Linga


लिङ्गाष्टकम्
Liṅgāṣṭakam
ब्रह्ममुरारिसुरार्चितलिङ्गम्निर्मलभासितशोभितलिङ्गम्
जन्मजदुःखविनाशकलिङ्गम्तत्प्रणमामि सदाशिवलिङ्गम् १॥
brahmamurārisurārcitaliṅgam nirmalabhāsitaśobhitaliṅgam | janmajaduḥkhavināśakaliṅgam tat praṇamāmi sadāśivaliṅgam || 1||

O Linga que é adorado por Brahma , Vishnu e todos os Devas
O Linga que é puro e radiante ,
O Linga que destrói a tristeza daqueles que estão encarnados ,
Eu reverencio o Linga que representa o Senhor SadaShiva .


देवमुनिप्रवरार्चितलिङ्गम्कामदहम्करुणाकर लिङ्गम्
 रावणदर्पविनाशनलिङ्गम्तत्प्रणमामि सदाशिव लिङ्गम् २॥
devamunipravarārcitaliṅgam kāmadaham karuṇākara liṅgam | rāvaṇadarpavināśanaliṅgam tat praṇamāmi sadāśiva liṅgam || 2||


O Linga que é adorado pelos sábios ,
O Linga , compassivo destruidor de Kama ,
O Linga , destruidor da arrogância de Ravana ,
Eu reverencio o Linga que representa o Senhor SadaShiva .


सर्वसुगन्धिसुलेपितलिङ्गम्बुद्धिविवर्धनकारणलिङ्गम्
सिद्धसुरासुरवन्दितलिङ्गम्तत्प्रणमामि सदाशिव लिङ्गम् ३॥
sarvasugandhisulepitaliṅgam buddhivivardhanakāraṇaliṅgam | siddhasurāsuravanditaliṅgam tat praṇamāmi sadāśiva liṅgam || 3||


O Linga que é ungido com todas as fragrâncias ,
Aquele que causa a expansão da inteligência ,
O Linga que é adorado por Siddhas , Devas e Asuras ,
Eu reverencio o Linga que representa o Senhor SadaShiva .


कनकमहामणिभूषितलिङ्गम्फनिपतिवेष्टित शोभित लिङ्गम्
दक्षसुयज्ञ विनाशन लिङ्गम्तत्प्रणमामि सदाशिव लिङ्गम् ४॥
kanakamahāmaṇibhūṣitaliṅgam phanipativeṣṭita śobhita liṅgam |
dakṣasuyajña vināśana liṅgam tat praṇamāmi sadāśiva liṅgam || 4||

O Linga que é adornado com ouro e pedras preciosas ,
que é radiante e tem o rei das serpentes enrolado em torno de Si ,
O Linga que destruiu o yagña de Daksha ,
Eu reverencio o Linga que representa o Senhor SadaShiva .


कुङ्कुमचन्दनलेपितलिङ्गम्पङ्कजहारसुशोभितलिङ्गम्
सञ्चितपापविनाशनलिङ्गम्तत्प्रणमामि सदाशिव लिङ्गम् ५॥
kuṅkumacandanalepitaliṅgam paṅkajahārasuśobhitaliṅgam |
sañcitapāpavināśanaliṅgam tat praṇamāmi sadāśiva liṅgam || 5||


O Linga que é ungido com açafrão e pasta de sândalo , e
parece radiante com uma guirlanda de flores de lótus ,
O Linga que destrói o demérito que foi acumulado ,
Eu reverencio o Linga que representa o Senhor SadaShiva .


देवगणार्चित सेवितलिङ्गम्भावैर्भक्तिभिरेव लिङ्गम्
दिनकरकोटिप्रभाकरलिङ्गम्तत्प्रणमामि सदाशिव लिङ्गम् ६॥
devagaṇārcita sevitaliṅgam bhāvairbhaktibhireva ca liṅgam | dinakarakoṭiprabhākaraliṅgam tat praṇamāmi sadāśiva liṅgam || 6||

O Linga que é adorado e tem archana oferecida pelos Devas ,
O Linga que é adorado com atitudes de devoção ,
O Linga que é brilhante como um milhão de sóis ,
Eu reverencio o Linga que representa o Senhor SadaShiva .


अष्टदलोपरिवेष्टितलिङ्गम्सर्वसमुद्भवकारणलिङ्गम्
अष्टदरिद्रविनाशितलिङ्गम्तत्प्रणमामि सदाशिव लिङ्गम् ७॥
aṣṭadalopariveṣṭitaliṅgam sarvasamudbhavakāraṇaliṅgam |
aṣṭadaridravināśitaliṅgam tat praṇamāmi sadāśiva liṅgam || 7||

O Linga que está envolvido com oito pétalas ,
O Linga que é o motivo de toda a criação ,
Aquele que destrói as oito misérias ,
Eu reverencio o Linga que representa o Senhor SadaShiva .


सुरगुरुसुरवरपूजित लिङ्गम्सुरवनपुष्प सदार्चित लिङ्गम्
परात्परं परमात्मक लिङ्गम्तत्प्रणमामि सदाशिव लिङ्गम् ८॥
suragurusuravarapūjita liṅgam suravanapuṣpa sadārcita liṅgam |
parātparaṁ paramātmaka liṅgam tat praṇamāmi sadāśiva liṅgam || 8||

O Linga que é adorado pelo guru dos Devas e pela elite dos Devas ,
O Linga que é adorado com flores divinas ,
O Linga que é mais elevado que o mais elevado , o ser supremo ,
Eu reverencio o Linga que representa o Senhor SadaShiva .


लिङ्गाष्टकमिदं पुण्यं यः पठेत् शिवसन्निधौ।
शिवलोकमवाप्नोति शिवेन सह मोदते॥
liṅgāṣṭakamidaṁ puṇyaṁ yaḥ paṭhet śivasannidhau |
śivalokamavāpnoti śivena saha modate ||

Tradução Sânscrito -Português: Rudra Natha

Uma estória Kapalika




Namaste amigos,

A Índia é uma terra cheia de narrativas que falam da Divindade e nos inspiram à reflexão. Gostaria de brindá-los com a estória do encontro de um Kapalika com o grande sábio Shankaracharya e o interessante desenrolar desta aventura.

Madhavacharya, que era discípulo do sábio Shankaracharya nos conta que nas montanhas de ShriParvata próximas ao rio Krishna havia um Kapalika chamado Ugra Bhairava que realizava suas Sadhanas (disciplinas espirituais) na região. Certa vez este Kapalika viu Shankaracharya nas proximidades e percebeu que suas ambições estavam próximas de ser realizadas. Ugra Bhairava então se aproximou de Shankaracharya e lhe prestou plenas reverências.

Na seqüência o Kapalika disse: -“Eu me dedicarei à satisfazer Kapalin (um dos nomes do Senhor Shiva) e desta forma alcançar meus objetivos. Eu adorei Ugra (outro nome de Shiva) através de severas austeridades por cem anos de forma que eu pudesse habitar no monte Kailasha e desfrutar a companhia de Shiva”. Muito satisfeito o Senhor Shiva lhe disse: -“Você conquistará a meta que os homens tanto desejam se, com o objetivo de me propiciar, você sacrificar numa cerimônia de fogo (Homa) a cabeça de um grande sábio ou a cabeça de um rei.” Após estas palavras o Senhor Shiva desapareceu. O Kapalika continuou: -“Desde aquele momento eu tenho buscado com a mente cheia de esperança porém eu ainda não encontrei um rei ou um sábio desejosos de serem sacrificados.”

De forma à persuadir Shankaracharya à ceder diante de seu desejo implícito Ugra Bhairava começou à louvar os grandes méritos do auto-sacrificio: -“Sou muito afortunado eu ter lhe visto, ó grande sábio que peregrinas pelo mundo para o bem-estar de todos os seus habitantes. Em breve meus desejos serão pacificados, pois os apegos de um homem terminam quando ele alcança o ponto de vista correto. O crânio de um rei coroado ou de um grande sábio são pré-requisitos para que eu obtenha Siddhi (o sucesso em seus objetivos). Quanto ao rei, não é sequer concebível que eu obtenha pois o dever de um rei é proteger seus súditos e estar sempre presente. Portanto cabe à ti esta importante realização. Ao oferecer sua cabeça tu alcançarás imensa fama em todo o Universo, e eu alcançarei Siddhis. Após meditar no caráter transitório do corpo, ó melhor entre os homens, tu deves fazer aquilo que é digno e auspicioso. Eu não posso me atrever à pedir por isto. Quem iria voluntariamente abandonar seu corpo, através do qual os desejos são realizados ? Entretanto tu és indiferente aos desejos mundanos e não se importa com o corpo. Tu assumiste seu próprio corpo para o beneficio da humanidade.”

O Kapalika tentava usar as doutrinas do Vedanta de Shankaracharya contra ele mesmo. Ugra Bhairava então se comparou, com grande modéstia, aos homens que só pensam em si-mesmos. Ele comentou que os homens que abandonam seus corpos transitórios em favor do bem-estar dos outros adquirem um eterno corpo de glória (Yasho Sharira). Suas excelentes virtudes encantam á toda a humanidade. Após vários outros versos do mesmo teor Ugra Bhairava fez então o seu pedido: -“Tu deves oferecer tua cabeça à mim”. Shankaracharya foi tocado pela comovente suplica e concordou em atender aquele pedido. Ele pensou: -“ Qual verdadeiro sábio, que sabe que o corpo humano é transitório, não atenderia aos apelos de um suplicante ?” Shankaracharya tinha que se basear nos princípios de sua teologia, na medida em que o Atman é a única realidade final, pouco importa o que acontece ao corpo. Ele é apenas uma criação de Maya (sob o ponto de vista do Vedanta).

Percebendo que seus discípulos jamais permitiriam este gesto, Shankaracharya combinou com Ugra Bhairava que se encontrariam num lugar secreto. Ele então se dirigiu à um lugar deserto e escondido de seus discípulos. Com toda a opulência Kapalika Ugra Bhairava foi buscar sua recompensa. Segurando um tridente erguido, cauteloso, usando Tilakas feitas com cinzas por todo o seu corpo nú, ostentando ornamentos feitos de ossos humanos e com os olhos vermelhos aparentando embriagues o Kapalika foi de encontro ao sábio.

Shankaracharya estava lá, sentado em posição Yogue de Siddhasana, esquecido de todo o universo, mergulhado em Samadhi (transe místico). Quando viu o sábio sentado em Siddhasana os temores de Ugra Bhairava se dissiparam e ele se preparou para agir com seu tridente. Tão logo ele se aproximou de Shankaracharya, um discípulo do sábio chamado PadmaPada chegou. Este discípulo era MantraSiddha (havia conquistado os poderes dos Mantras) e logo trouxe à sua mente a imagem de NrSimha Deva que socorre os aflitos que o evocam. Instantaneamente o discípulo se transformou em NrSimha, correu com grande velocidade e saltou sobre Ugra Bhairava cravando suas garras em seu peito. O Kapalika então abandonou seu disfarce e se mostrou em sua verdadeira identidade – o Senhor Shiva na forma terrível de Bhairava. Ele então se dirigiu à Shankaracharya e falou numa voz que ressoava como trovões: -“Senhor, esta é um derrota para o não-dualismo (Advaita), onde esta sua igualdade para com amigos ou inimigos ? Da mesma forma que um lutador derruba seu adversário derrubando-se à si mesmo, eu realizei a queda da sua doutrina através da perda de meu próprio corpo. E, agora, tu vais encontrar teu próprio destino ! Levante-se ! Tu deves lutar !”

Na seqüência o Senhor Shiva na sua forma de Bhairava lutou e decapitou Shankaracharya e quatro de seus discípulos que haviam chegado ao local. Após o combate o sábio e seus discípulos foram ressuscitados com o Mrtyunjaya Mantra (o Mantra que vence a morte) e foi então que surgiu o verdadeiro desapego – o Karma Yoga, a ação sem apego aos frutos.

No Kularnava Tantra o Senhor Shiva diz: “Alguns aceitam o dualismo (Dvaita) e outros o não-dualismo (Advaita) porém eles não conhecem minha essência que está além do dualismo e do não-dualismo”.

Que Mãe Kali nos abençoe

Rudra