Genealogia pós-diluviana
Já comentamos em ocasiões anteriores sobre a descrição do dilúvio universal (Vārāha Pralaya) conforme as narrativas aceitas e preservadas entre os Tantricos. Um dos textos de referencia primária sobre este tema é o Kālikā Purāṇa (XXXII à XXXIV) e é de lá que compilamos a narrativa do período pós-diluviano onde aqueles que foram salvos dentro do imenso barco construído por Svāyambhuva Manu se empenharam na reconstrução de tudo.
Antes do advento do Vārāha Pralaya o mundo era governado por Svāyambhuva Manu um regente reconhecido por sua ponderação e sabedoria e os reinos progrediam. Numa certa ocasião um sábio que se apresentou como Kapila Muni foi até o palácio para audiência e diante de Svāyambhuva Manu solicitou terras para que pudesse executar suas disciplinas espirituais e partilhar seus méritos. Svāyambhuva refletiu sobre o pedido e argumentou que nenhum dos outros grandes sábios jamais havia lhe solicitado terras anteriormente e que haviam inúmeros lugares reconhecidamente sagrados e de peregrinação que eram accessíveis à todos aqueles desejosos de praticar suas Sādhanas e disciplinas espirituais. Diante da negativa Kapila Muni enfureceu-se e proclamou uma terrível maldição diante do governante: “Todo o que existe, todas as construções e reinos assim como todos os seres perecerão numa imensa destruição que, em breve, se abaterá sobre o mundo”. Svāyambhuva sentiu a Śhakti, a Força Espiritual, daquelas palavras e foi tomado pelo pavor. Kapila Muni desapareceu após pronunciar a maldição e, então, Svāyambhuva decidiu deixar o palácio e dedicar um tempo à suas próprias disciplinas espirituais para entender (e talvez impedir) aquele terrível destino.
Svāyambhuva decidiu recitar um Mantra de Viṣṇu e pedir por sua intercessão..... Entretanto, o que ele não sabia é que o sábio Kapila Muni era apenas o próprio Viṣṇu disfarçado num corpo humano para revelar a tragédia futura. O motivo da tragédia vindoura foi um conflito de proporções cósmicas entre Vārāha e Śharabha que, inevitavelmente, teria reflexos sobre o plano terrestre.
Após suas disciplinas espirituais Svāyambhuva retornou ao palácio e, num dia, deparou com uma pequenina criatura que lhe pediu socorro. Era um minúsculo peixinho que foi então levado para um aquário no palácio e cuidado como se fosse um filho do governante. Com o tempo a criatura assumiu proporções enormes e o Manu lhe confrontou: “Diante dos eventos eu sei que você não é um peixe. Diga-me quem tu és na verdade.”. Ao ser confrontada a criatura mostrou sua verdadeira forma – o próprio Viṣṇu, que numa voz semelhante aos trovões anunciou: “O sábio Kapila que lhe alertou era eu mesmo e agora chegou o momento de lhe advertir sobre um terrível dilúvio que varrerá toda a Terra.”
O Senhor Viṣṇu orientou o governante à construir um imenso barco com madeiras resistentes. Esse barco deveria abrigar amostras de todos os seres, plantas e sementes que haviam sobre a Terra assim como todo o conhecimento acumulado (Vedas), Dakṣha, o prestigiado sacerdote, e os sete grandes sábios. Assim foi feito e, conforme anunciado, a catástrofe se abateu sobre o planeta.
Quando as águas baixaram Brahmā, Viṣṇu e Śhiva se aproximaram do imenso barco e falaram à Svāyambhuva, Dakṣha, os sete sábios e à Nara e Nārayaṇa (mentalmente criados por Brahmā e colocados então no barco). Estes dois últimos foram orientados à usar sua Força Espiritual (Śhakti) para restabelecer plenamente os Devas em suas funções. Svāyambhuva foi encarregado de plantar todos os gêneros vegetais de forma que a Terra se tornasse novamente abundante. Dakṣa, o expert sacerdote e os sete sábios foram orientados à realizar poderosos Yajñas para propiciar Hari e reacender as chamas dos rituais.
Dakṣha e os sete sábios (Kaśhyapa, Atri, Vaśiṣṭha, Viśvāmitra, Gautama, Jamadagni e Bharadhvāja) realizaram um grande Yajña que durou doze anos. Após .este rito Dakṣha criou treze filhas (Aditi, Diti, Danu, Kālā, Danāyu, Simhikā, Muni, Pradhā, Variṣṭhā, Vinatā, Kapilā, Krodhā e Kadru) todas incrivelmente férteis e as entregou ao sábio Kaśhyapa para que repovoassem o mundo:
Da união de Kaśhyapa com Aditi nasceram os doze Adityas;
Com Diti Kaśhyapa teve apenas um filho – HiraṇyaKaśhipu e deste nasceram Prahlāda, Somhlāda, Bāṣkala e Śhibi;
Kaśhyapa e Danu tiveram quarenta filhos. A descendência destes quarenta se espalhou pelo mundo;
Com Danāyu Kaśhyapa teve quatro poderosos filhos: Vīrabhadra, Vīkṣhara, Vatsa e Vṛtta;
Com Kālā quatro filhos também foram gerados: Vināśhana, Krodha, Krodhahantā e Krodhachakra. Estes filhos se tornaram os reis entre as nações surgidas dos filhos de Danu;
Kaśhyapa e Siṁhikā tiveram também quatro filhos: Rāhu, Suchandra, Chandrahantā e ChandraVimardana;
Com Muni ele teve um filho chamado Śhukra que veio à se tornar o Guru da descendência dos filhos de suas esposas Diti, Danu e Kālā. Śhukra, por sua vez, teve quatro filhos, todos sacerdotes dos Asuras. Além de Śhukra a esposa Muni teve outros vinte e um filhos e oito filhas;
Com Prādhā Kaśhyapa teve dez filhos que se tornaram Devas, Apsarās e Gandharvas;
Com sua esposa Vinatā ele teve seis filhos: Tārkṣhya, Ariṣṭanemi, Anuru, Garuḍa, Āruṇi e Vāruṇi.
Com Kapilā o sábio Kaśhyapa gerou Amṛta, os Brāhmaṇes, o gênero bovino e vários sábios;
Com a terrível Krodhā Kaśhyapa teve oito filhos: Vegavān, Ketumān, Ayaḥsu, Bhānu, Aśvodyapati, Kṛṣṭu, Aṣṭaparvā e Ajuru. Todos os filhos das esposas Simhikā e Krodhā foram conhecidos por sua crueldade;
Com sua esposa Kadru o sábio teve seis filhos: Śheṣha, Vāsukirāja, Takṣhaka, Kulika, Kūrma e Sumanā.
Não há registro de filhos com sua esposa Variṣṭhā.
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