quarta-feira, 2 de setembro de 2015

PanchaMakara - Oferendas Tantricas



“ Beber vinho, comer carne, estar junto à pessoa amada”. Nenhum destes atos conduz à realização do Estado Supremo.”
Kularnava Tantra capitulo II, verso 112.


O verso do Kularnava Tantra adverte sobre o indevido fascínio que as oferendas Tantrikas podem exercer sobre os leigos. O uso ritual destas oferendas, chamadas de PanchaMakara, tornaram o Tantra famoso e infame entre os Ocidentais que não tiveram contato com a tradição milenar praticada entre Hindus, Budistas e Jainistas tanto na Índia, Nepal, Tibet ou outras partes do sudeste Asiático.

Estas oferendas Tantrikas são cinco em ordem de importância e prioridade: 1. o “vinho” cujo nome usado pelos iniciados indica que está acima de todos os demais elementos rituais. Tamanha é a sua importância que ele é identificado com a própria Shakti – o Poder Espiritual que tudo mantém. 2. A carne, identificada com o Senhor Shiva. Indispensável para a prática do Tantra. Nenhum destes dois elementos pode ser usado sem seu par, da mesma forma não há ritual Tantriko na ausência destes. (Kularnava Tantra cap. VI, verso 64).

“O vinho é Shakti, a carne é Shiva. Aquele (adepto) que desfruta de ambos é o próprio Bhairava.“ Kularnava Tantra cap. V, verso 79

3. O terceiro elemento é o peixe e representa a linha de sucessão discipular. Não há Tantra sem Guru, sem a transmissão de Shaktipat que é a energia espiritual para o recebimento das bênçãos associadas à este caminho. Esta oferenda é identificada com o revelador dos Tantras no Kali Yuga, o Guru Primordial.

“ Iludidos pelo falso conhecimento propagado por aqueles distantes da tradição Guru-Discípulo, muitas pessoas especulam em suas próprias fantasias qual seria a natureza do KulaDharma. “ Kularnava Tantra cap II, verso 116

4. O quarto item são os grãos, identificados com o “selo”, a “autenticação” da tradição recebida. Eles celebram a sacralidade dos cinco elementos e do uso ritual que é feito com os itens anteriores. Sob este aspecto representam o fruto puro (KarmaPhala) obtido pela realização da ação correta (Dharma).

5. O ultimo dos elementos é o Maithuna e representa uma realização, um “estado”, que é obtido pelo oferecimento dos quatro itens que lhe são anteriores e prioritários. Ele representa a identidade, ou seja, o Samadhi alcançado pela identificação da Shakti Universal com o Atma, a alma individual, vivenciada no momento ritual. Esta suprema identificação é possível após a ascensão de Kundalini obtida no oferecimento do primeiro e mais importante elemento – o vinho. (Kularnava Tantra cap. V, verso 107). Na prática dos grupos Tantrikos esta realização é frequentemente representada pelo oferecimento de um flor aos pés da Murti de Kali.

Uma interessante curiosidade sobre as oferendas Tantrikas é que, em geral, o não-iniciado vê com maior relevância o símbolo do rito bem-sucedido do que a própria prática que leva ao sucesso (Siddhi). Desta forma o ultimo elemento se torna, indevidamente, o primeiro e mais importante ! Muito se especula sobre o quinto “M”, o Maithuna, como se este tivesse algum segredo acima de todas as outras disciplinas espirituais. Talvez ele tenha, o segredo de satisfazer as carências físico/emocionais com algum glamour e aroma de incenso. Como se fosse um atalho mágico que livraria o detentor deste “segredo” da necessidade de amadurecer como pessoa e buscar uma relação equilibrada, sem jogos de poder. Se apresentar como praticante de “sexo Tantriko” (sic.) é uma bela máscara, uma teatro, uma “identidade” socialmente aceita em alguns círculos para se apresentar como alguém com algum tipo de “poder oculto” e assim esconder suas próprias carências, fragilidades e dificuldades de amadurecimento.

Interessante observar que muitos dos grandes mestres Tantrikos da história recente sejam, ou tenham sido celibatários. Fato este que desmorona com a teoria, muitas vezes aceita no Ocidente, de que o Tantra seria alguma solução miraculosa para a satisfação de uma sexualidade frustrada. Vama Kshepa (Bam Dev) do campo crematório de Tara Pitha foi celibatário por toda sua vida, o mesmo acontece com Vamacharya Sanjay Natha de Bihar. Um outro exemplo, Kapalika Mahakala Bhairavananda, assumiu os votos de celibato após o falecimento de sua esposa. E, se levarmos em consideração as iniciações Tantrikas recebidas por Shri RamaKrishna e reconhecermos nele um adepto, veremos que ele também se manteve celibatário por toda a vida.

Enfim, este caminho de realização espiritual tem suas próprias peculiaridades. Assim como todos os demais. E, ao buscar um Guru que o auxilie nesta jornada, o(a) interessado(a) deve avaliar criteriosamente se seus anseios e expectativas serão lá satisfeitos.

Todos nós temos a centelha Divina em nossos corações, temos, à priori, a capacidade de nos realizar em cada anseio de nossas vidas. Temos em nossas mentes a aptidão para viver em equilíbrio com o mundo á nossa volta, em nossos braços a força de realização e conquista para obter o necessário à uma vida digna e em nossas almas a sede serena que busca pela fonte do que é belo e sublime. Viver a magia de um relacionamento gratificante e desfrutar de uma vida sexual saudável são certamente experiências muitos valiosas. E estas podem ser alcançadas mesmo antes do chamado interno da alma pela Libertação Final, Moksha. Não é necessário um álibi para a desfrutar destes momentos e o Tantra não foi revelado com este objetivo.

O Tantra se apresenta em suas próprias escrituras e em seus próprios textos milenares como um caminho para a comunhão com a Divindade, sem mascaras, sem massagens milagrosas e sem aquela velha brincadeira infantil de querer parecer mais importante do que se é.  

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