sábado, 22 de junho de 2019

Por que cinco elementos na Puja ?


Pañchopachara Puja
A Puja de cinco elementos

A palavra “Puja” vêm da língua Sânscrita e uma importante escritura chamada Kularnava Tantra comenta que Pujá é aquilo que dá origem aos méritos espirituais (Punya). Toda Puja possui conceitos e procedimentos básicos que são comuns à todas as tradições embora a realização destes procedimentos possa variar conforme a disponibilidade de tempo e recursos materiais assim como do conhecimento da pessoa que os realiza. O primeiro conceito que deve ser entendido sobre uma Puja é que ela é uma forma de Yajña, esta palavra em Sânscrito significa sacrifício. No capitulo três da Bhagavad Gita há interessantes reflexões sobre o Yajña começando pelo verso 8 onde se afirma a superioridade da ação sobre a inércia.Do verso 9 até o verso 16 vários aspectos do Yajña e sua importancia são relembrados. A ciência do Yajña é minuciosamente estudada pelo ramo da filosofia Védica chamado de Purva Mimamsa.

Para fins didáticos se afirma que todo Yajña possui, no mínimo, três elementos básicos: Devata – um ideal de perfeição, aquilo que é almejado e que nos inspira; Dravya – aquilo que é oferecido, aquilo que abrimos mão e “sacrificamos” para alcançar algo superior; e Mantra – a vibração e ressonância desta ação de oferecer ou, no âmbito humano, a reflexão verbal e inteligível expressa em palavras e que transmite o significado de nossas ações.

O que chamamos de Puja de cinco elementos é aquela onde as cinco oferendas essenciais estão presentes. Cada uma destas oferendas possui um significado e uma justificativa prática para o seu uso, por isso elas foram prescritas pelas injunções (Vidhi) dos Agamas, Tantras e Puranas. Uma injunção não é algo para apenas maravilhar-se ou louvar a sabedoria ou riqueza simbólica de suas reflexões, uma injunção é algo para ser realizado, para ser feito, e seus frutos só são alcançados através da ação.

Este tema é muitissimo extenso e exige um estudo detalhado por isso para resumir a relação entre as oferendas e a Divindade recorremos à um pequeno trecho do diálogo entre Uddalaka e YajñaValkya descrito no BrahadAryanaka Upanishad. Este diálogo aconteceu na corte do rei Janaka após um grande Yajña aonde centenas de sábios estavam presentes. Este rei é mencionado na Bhagavad Gita capitulo três verso 20 como um homem que atingiu a auto-realização apenas por cumprir o seu dever. Nos versos seguintes (22 e 24) o Senhor Supremo menciona que até Ele se dedica à constante ação e que, sem ela, todo o Universo seria levado à destruição. Décima pergunta feita por Uddalaka após as respostas de 3339, 333, 33, 6 e 3 Deuses. 
Uddalaka perguntou: - “Quantos Deuses existem ?”
YajñaValkya respondeu: - “Dois, Prana (a energia vital) e Anna (o alimento).”

Este trecho nos ajuda à entender a perspectiva de Deus (Brahman) presente em todas as coisas mencionada nos Vedas. Brahman assume múltiplas formas e apresentações e até as almas individuais (Jiva) são manifestações de Brahman. Prana e Anna são “apresentações indiretas” (Paroksha) de Brahman, estas apresentações indiretas permeiam todo o universo.

Por que usamos cada um destes elementos numa Puja ?
Dipa (Luzes) – A presença da luz é uma das analogias mais comuns sobre a Divindade e a espiritualidade. Mas por que a luz assume este significado ? A luz pode ser diretamente produzida (Prakashana) ou um reflexo (Vimarshana) porém, em ambos os casos, ela iluminará .... Sempre que há luz há um combustível que permite a sua existência, há algo que queima e é sacrificado para que o bem precioso da luminosidade esteja presente. Isso acontece no fogo de uma lamparina, nas chamas de uma cerimônia de fogo (Homa, Havana etc..) ou até mesmo no Sol onde o Hidrogênio é usado como combustível. Portanto a presença da luz é o “selo”, o fruto, a testemunha visível (Drshya) de todo Yajña. Sempre que temos a presença de uma chama no local do ritual indicamos que ali realiza-se um Yajña. Onde há inércia, ou seja, a "não-ação" há escuridão; onde há a correta ação, o sacrificio, há luz.

Gandha (“óleo perfumado”) – Muito do que fazemos diariamente não é fruto de uma reflexão ou de algum processo racional mas sim a expressão de uma “tendência”, de um “reflexo adquirido” ou “impulso latente” em nossas mentes. Esse impulso é chamado de Vasana em Sânscrito, palavra originada do verbo vās/vāsavati (वास् वासवति) cuja raiz significa perfumar ou “dar cheiro”. Quem não se vira para reconhecer a moça de delicioso perfume que entra numa festa ? e ser abençoado pela visão de sua beleza. Quem não se preocupa diante do cheiro de fumaça em sua casa ? com o pressentimento de eventual perigo. Quem não aprecia o aroma de comida pronta para o almoço ? relembrando seus sabores e satisfação. Vasana, o impulso de agir à partir de uma impressão prévia, é a base do Karma que colhemos em nossas vidas. Somos e desfrutamos daquilo que instintivamente nos aproximamos.

Pushpa (Flores) – O desabrochar das flores é certamente um dos mais claros sinais de energia vital (Prana) na natureza. A sua presença é indicadora de vida e anunciadora de frutos vindouros. O Prana sendo energia vital é uma das manifestações de Chit Shakti, a Força Espiritual da Consciência. As flores são geralmente representadas nas Mandalas onde prestamos reverencias a “corte angelical” (Avarana Devatas) que acompanha toda Deidade. As pétalas das flores refletem a verdade espiritual de que nenhuma forma da Divindade atua sozinha e que sempre transborda vida e bem-aventurança para outras entidades que a acompanham.

Dhupa (Incenso) – O ritmo respiratório é um dos sinais de vitalidade de um organismo e suas variações indicam indiretamente o aumento ou diminuição da energia vital (Prana). O aromático incenso transforma o simples ato de respirar numa experiência diferente e estimula instintivamente o aprofundamento do ritmo respiratório. Estar confortável em ambiente onde o incenso é queimado indica que a pessoa pode lidar com níveis mais elevados de energia em sua mente. Na presença de bloqueios energéticos ou respiratórios a tendência natural é a de manter a respiração o mais superficial possível para evitar a manifestação de lembranças ruins profundamente escondidas na mente. Neste caso a queima do incenso pode ser interpretada como uma experiência não-prazerosa.  

Naivedya (Alimento) – Há inúmeras referencias escriturais nas Upanishads sobre a sacralidade do alimento (vide Chandogya, Taittirya, Maitra, Brhad Upanishads etc..). A presença de alimento chega à ser comparada à presença de Brahman. É o alimento que nos permite agir, refletir, adorar e buscar a Divindade. É o alimento que mantém a chama da vida. Em toda atividade do Dharma como recitar Mantras, fazer uma Puja etc. deve manter-se uma porção de alimento, mesmo que essa porção seja tão pequena como uma fruta.

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